Lula, Bolsonaro e o Nordeste: algumas notas

 

Por Michell Leonard Duarte de Lima Tolentino, Doutorando em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP), Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco. 

 

As eleições gerais ocorridas em 2018 ficaram marcadas pelo seu caráter disruptivo nas mais diversas esferas. Em meio a um contexto de crise econômica generalizada, aumento dos índices de violência urbana, denúncias de corrupção e até mesmo a prisão de Lula, ocorreram as eleições brasileiras para os principais cargos da República. Jair Bolsonaro, até então um deputado federal inexpressivo no jogo político, mas frequente em programas de TV “popularescos”, lança-se candidato. Embora apareça já no período pré-eleitoral como segundo colocado na disputa para Presidente da República, Bolsonaro tem sua candidatura desacreditada por amplos setores, sendo visto como um candidato que “derreteria” rapidamente quando a eleição se iniciasse de fato.

            Contrariando as análises prévias, Bolsonaro ganha força durante o período eleitoral, sobretudo após o episódio do atentado contra sua vida durante ato político em Juiz de Fora - MG. O “teto eleitoral” do candidato, que muitos analistas julgavam ser de 20% dos votos, ultrapassa esse patamar. Em tal contexto, aliados de primeira hora como líderes evangélicos neopentecostais aprofundam seu apoio ao candidato, setores ligados ao agronegócio também, parcela importante dos militares passa a apoiá-lo explicitamente, engrossando o apoio desse setor a campanha de Bolsonaro.

            Candidatos sem tradição na política institucional passam a apoiar o então candidato a presidente, crescendo junto ao nome de Bolsonaro. No Rio de Janeiro, por exemplo, Wilson Witzel – um ex-juiz federal sem participação na política institucional – é eleito governador. Em Minas Gerais, elege-se Romeu Zema, pelo Partido Novo. Em São Paulo, João Dória chega a ser acusado de traição por abandonar a campanha de presidente de Geraldo Alckmin, do seu partido, o PSDB, em favor do “BolsoDoria”. Para além dos casos referentes aos cargos de governador de estado, candidatos outsiders alinhados a Jair Bolsonaro conseguem votações expressivas em cargos para deputado federal e estadual[1]. Posto como principal alvo das ferozes críticas de Bolsonaro, o Partidos dos Trabalhadores (PT) vê candidatos com grande potencial de vitória “derreterem” durante as eleições[2].

            No que diz respeito ao desempenho por estados e regiões brasileiras, Bolsonaro vence no Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Norte.  Nas três primeiras regiões citadas, Bolsonaro atinge patamares acima dos 65%. Em Santa Catarina, Jair Bolsonaro tem seu melhor desempenho, chegando a mais de 75,92%, enquanto Fernando Haddad perfaz apenas 24,08% dos votos naquele estado. Nos três maiores colégios eleitorais – São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro – Bolsonaro atinge patamares altos, 67,97%, 58,19%, e 67,95%, respectivamente.

            Em meio à “Onda Bolsonaro”, o Nordeste destoa do resto do país. Nesta região Fernando Haddad, candidato pelo PT, chega a expressivos 69,7% dos votos no 2º turno, vencendo nos nove estados da região, enquanto Bolsonaro perfaz apenas 30,3%. Além de vencer nos nove estados, Haddad só tem menos de 60% dos votos no estado de Alagoas (59,92%). Tais dados parecem indicar a “Onda Bolsonaro” enquanto pouco significante entre os eleitores nordestinos. Até aqui o leitor há de pensar que a região Nordeste apenas reafirma a mesma tendência das três outras eleições presidenciais anteriores, quando se tornou uma espécie de base de votos do PT nas eleições presidenciais. No entanto, ao observamos determinados movimentos, percebemos alguns pontos novos a serem considerados. Um primeiro ponto inédito é o fato de nos nove estados nordestinos, apenas governadores do PT ou aliados terem vencido as eleições, sendo que o PT governa quatro estados[3]. Ademais, destes nove governadores, sete se elegeram em 1º turno, sendo que apenas 13 governadores, de um total de 27 unidades federativas, conseguiram tal feito em todo país. Dos sete eleitos em 1º turno, no Nordeste, Ruy Costa, da Bahia; Camilo Santana, do Ceará; e Renan Filho, em Alagoas, alcançam mais de 75% dos votos. Neste contexto, um outro ponto que merece destaque é o fato dos principais candidatos de oposição ao PT e seus aliados no Nordeste não terem declarado apoio explícito a Jair Bolsonaro, nem tentado “colar” seu nome ao de qualquer candidato à presidência situado à direita do espectro político[4]. No que diz respeito a eleição de candidatos outsiders de extrema direita, o fenômeno ocorre no Nordeste apenas residualmente, não havendo quase nenhum nome em cargos majoritários.

O Nordeste pareceu, portanto, seguir caminho diverso daquele do restante do país durante as eleições. Não apenas porque o PT se reafirmou eleitoralmente na região, mas também pelo fato de candidatos alinhados ao que foi chamado de “nova direita”, em sua maioria aliados à “onda conservadora”, não terem conquistado o mesmo êxito que no resto do país.

No que se refere aos políticos da “direita tradicional”, em sua maior parte herdeiros de oligarquias nordestinas, restaram, sobretudo, dois caminhos: alinhar-se ao nome de Lula de maneira oportunista ou terem resultados pífios durante as eleições. Assim, mesmo em meio ao avanço conservador no país, o PT não encontrou oponente a altura no Nordeste, tornando-se um “gigante eleitoral” na região diante do frágil desempenho da “direita tradicional” e da quase não renovação de lideranças deste espectro político. Ademais, um outro ponto que merece atenção diz respeito à consolidação, durante as eleições de 2018, de lideranças petistas no Nordeste, fazendo com que o PT não se restringisse apenas ao nome de Lula na região[5]. Além do PT, seus aliados, de diferentes partidos e matrizes ideológicas, também lograram êxito durante as eleições de 2018[6]. Dessa forma, o Nordeste se firma enquanto região de oposição ao bolsonarismo.

            No ano de 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, os nove governadores nordestinos fundam o Consórcio Nordeste enquanto um instrumento articulador de pactos de governança regional, bem como de integração dos nove estados da região nos âmbitos político, jurídico e econômico. Tal fato evidencia a ação política dos governadores do Nordeste enquanto grupo com certa homogeneidade. Muito embora o Consórcio Nordeste não tenha sido articulado com o objetivo de antagonizar com o governo federal, a relação de Bolsonaro com os governadores sempre foi eivada de tensões. Em julho de 2019, tais tensões se tornaram ainda mais explícitas quando o presidente, antes de um café-da-manhã com jornalistas da imprensa estrangeira, em conversa informal com o então Ministro da Casa Civil Onix Lorenzoni, tem seu áudio captado pelos microfones da TV Brasil. O presidente disse: “Daqueles governadores de “paraíba”, o pior é o do Maranhão; tem que ter nada com ele”. Tal frase gerou declarações indignadas por parte de Flávio Dino (PCdoB) e João Azevedo (Cidadania), governadores de Maranhão e da Paraíba respectivamente. Os governadores dos estados do Nordeste ainda publicam uma carta conjunta no qual expressam sua indignação com o presidente.

            A relação de Bolsonaro com o Nordeste só começará a mudar quando ele inicia uma aproximação com o chamado “Centrão”, bloco político no qual estão vários políticos nordestinos importantes, principalmente aqueles representantes de oligarquias e do que Bolsonaro até então chamava de “velha política”.  Para além de uma aproximação com alguns políticos da região, o presidente passa a investir fortemente em uma tentativa de se aproximar do eleitor nordestino. Em 2020, Bolsonaro visita 16 vezes o Nordeste, enquanto em 2019 havia ido a região apenas 6 vezes. Fotografias com o chapéu de vaqueiro nordestino se tornam cada vez mais comuns. Um de seus filhos até chegou a publicar um videoclipe com um jingle em ritmo de forró no qual o nordestino diria versos como : “Bem-vindo, meu presidente, me desculpe se eu fui com você indecente”, “Perdão por não ter votado em ti, é que passaram uma imagem falsa do senhor pra nossa gente”. Em uma das várias visitas à região, o presidente ainda inaugura obras do Trecho Norte da Transposição do Rio São Francisco no Ceará. Mais que a inauguração de uma obra, a transposição do São Francisco é algo importante na simbologia política que faz de Lula próximo ao povo nordestino. Por todos os lados, é perceptível a tentativa Bolsonaro de se aproximar do Nordeste e de acabar com a última grande base eleitoral do PT.

            A pandemia de Covid-19 traz inesperados elementos à relação entre Bolsonaro e o Nordeste. Com as recomendações de isolamento social, governadores e prefeitos, em todo o país, passam a decretar o fechamento por tempo indeterminado dos estabelecimentos que prestam serviços considerados não-essenciais. Nesse contexto, o congresso aprova, ao final de março de 2020, o auxílio emergencial de R$ 600,00[7] por três meses, sendo posteriormente estendido com valor mais baixo por mais três meses.

            Apesar da aprovação do auxílio emergencial com o valor de R$ 600,00 ter encontrado, inicialmente, resistência por parte do executivo, o pagamento do auxílio irá impactar positivamente na aprovação do governo Bolsonaro, uma  vez que muitos beneficiários atribuirão tal ato ao presidente. Além disso, o discurso de Bolsonaro contra as medidas de fechamento do comércio e dos serviços não essenciais encontrará uma considerável acolhida em setores da população, entre eles as classes mais pobres, temerosas dos impactos dos decretos em seu sustento.

            Nesse contexto, ao analisarmos a série histórica da pesquisa do Datafolha (2019, 2020, 2021) sobre a reprovação do governo Bolsonaro, percebemos que entre agosto e dezembro de 2020, mesmo em meio à pandemia e ao aprofundamento da crise econômica, há uma queda na reprovação do governo federal em todos os estratos de renda. Essa queda da reprovação é mais acentuada nos indivíduos que ganham até dois salários-mínimos. Em dezembro de 2020, apenas 27% destes indivíduos classificavam o desempenho do governo como ruim ou péssimo, sendo o menor patamar de reprovação do governo Bolsonaro entre todas as classes de renda (ver gráfico 01).

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            Fonte. Organização própria a partir das pesquisas Datafolha (2019, 2020, 2021)

Sabendo-se que o Nordeste é a região do país que concentra a maior parte da população que recebe menos de dois salários-mínimos, seria de se esperar que Bolsonaro tenha diminuído sua rejeição naquela região. De fato, é o que acontece! Enquanto o governo Bolsonaro, na pesquisa do Datafolha de junho de 2020 apresentava 52% de reprovação, na pesquisa de agosto esse número cai para 35%, sendo a maior queda de reprovação entre as regiões. Começa a se especular até que ponto a hegemonia do PT estava ameaçada na região. Questiona-se se Bolsonaro conseguiria repetir um realinhamento das classes semelhante ao que aconteceu com Lula em 2006, quando percebeu-se que enquanto a classe média abandonava o PT, o subproletariado passava a apoiar o partido, sobretudo no Nordeste (c.f. SINGER, 2012). No entanto, embora consideremos a acentuada queda da reprovação do governo Jair Bolsonaro no Nordeste um fenômeno relevante, a nosso ver um outro ponto merece destaque na análise destes números, de maneira a confrontá-los. Mesmo com a queda de reprovação, a região ainda é o pior cenário para Bolsonaro em dezembro de 2020. Diferentemente das classes de renda, nas quais os indivíduos que recebem menos de dois salários mínimos se tornaram o grupo de renda com menor reprovação à Bolsonaro naquele período, o Nordeste continua sendo uma das duas regiões com maior reprovação ao governo do atual presidente, sendo ainda a única região que apresenta porcentagem de reprovação acima da aprovação (de acordo com o Datafolha, em dezembro de 2020, 34% dos eleitores do Nordeste respondem que o governo Jair Bolsonaro é ruim ou péssimo (ver gráfico 02), enquanto 31% respondem que é ótimo ou bom). Desse modo, Bolsonaro estaria, mesmo em um de seus melhores momentos de popularidade, distante de repetir o realinhamento que Lula realizara em 2006.

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Fonte. Organização própria a partir das pesquisas Datafolha (2019, 2020, 2021)

           

Após dezembro de 2020, o cenário complica-se para o presidente. As duas pesquisas realizadas em 2021 - nos meses de janeiro e março, em um cenário de fim do auxílio emergencial e aumento dos casos de Covid-19 - evidenciam a deterioração da popularidade do governo Jair Bolsonaro. Nos grupos por renda, a reprovação ao governo aumenta em todos eles, sendo mais acentuado no grupo que ganha até dois salários-mínimos, atingindo 44% de menções negativas em março de 2021, igualando o registado em junho de 2020, pior patamar da série histórica (ver gráfico 01). O grupo no qual Bolsonaro tem menor reprovação agora é aquele que recebe entre dois e cinco salários-mínimos, ainda que seguido de perto pelo grupo que recebe menos de dois salários-mínimos. O que evidencia que no atual cenário, embora crítico para o presidente, ainda são os grupos mais pobres aqueles que dão algum suporte a Bolsonaro. O mesmo não pode ser dito do ponto de vista regional. Embora o Nordeste seja a região que concentra a maior parcela dos setores mais pobres da população, a região continua tendo os maiores índices de rejeição à Bolsonaro. Entre as pesquisas Datafolha de dezembro de 2020 e janeiro de 2021, a reprovação à atuação do governo federal sai de 34% em dezembro e chega a 43%, elevando-se a 49% em março, voltando a patamares semelhantes à antes do auxílio emergencial (ver gráfico 02). A aprovação cai a 24% na região, dado registrado somente em dezembro de 2019, no início do governo Bolsonaro. Ao que parece, se Bolsonaro ainda encontra algum apoio nos mais pobres, estes mais pobres não são necessariamente nordestinos. Também não eram no período de pagamento do auxílio emergencial. Esse descompasso entre o apoio dos mais pobres a Bolsonaro e a falta de apoio do presidente no Nordeste chama atenção para questões mais profundas no que diz respeito ao apoio nordestino ao lulismo[8].

            Para piorar a situação de Jair Bolsonaro e suas pretensões à reeleição, Lula está de volta ao jogo e em pesquisa do Datafolha publicada em 22 de março de 2021, sobre os atos do ministro Edson Fachin que resultaram na recuperação dos direitos políticos de Lula, o Nordeste tem o maior porcentual regional de indivíduos que aprovam as ações de Fachin, chegando a 60%. O Nordeste também possui o maior porcentual regional de indivíduos que consideram a condenação de Lula, em 2007, injusta, sendo 54% dos entrevistados. Além disso, a mesma pesquisa evidencia que 63% dos entrevistados no Nordeste consideram que Lula deveria concorrer a próxima eleição. Pelo que se vê no cenário atual, apesar de todos os esforços de Jair Bolsonaro, o Nordeste continua sendo uma fortaleza do lulismo. Com Lula elegível, o êxito de Bolsonaro na sua tentativa de destruir o lulismo no Nordeste se torna cada vez mais difícil.

           

           

Bibliografia

DATAFOLHA .Avaliação do presidente Jair Bolsonaro. São Paulo: Folha de São Paulo, abril/2019.

___________. Avaliação do presidente Jair Bolsonaro. São Paulo: Folha de São Paulo, julho/2020.

___________. Avaliação do presidente Jair Bolsonaro. São Paulo: Folha de São Paulo, agosto/ 2019.

___________. Avaliação do presidente Jair Bolsonaro. São Paulo: Folha de São Paulo, dezembro/ 2019.

____________. Opinião sobre a pandemia Coronavírus. São Paulo: Folha de São Paulo, abril/2020.

____________.Avaliação do governo Jair Bolsonaro. São Paulo: Folha de São Paulo, maio/2020.

____________. Avaliação do presidente Jair Bolsonaro/ Envolvimento do presidente com Fabrício Queiroz. São Paulo: Folha de São Paulo, junho/ 2020.

____________. Avaliação do presidente Jair Bolsonaro. São Paulo: Folha de São Paulo, agosto/ 2020.

____________. Pesquisa Nacional. São Paulo: Folha de São Paulo, dezembro/ 2020.

___________. Avaliação do presidente Jair Bolsonaro. São Paulo: Folha de São Paulo, janeiro/ 2021.

___________. Pesquisa Nacional: avaliação do presidente Jair Bolsonaro. São Paulo: Folha de São Paulo, março/ 2021.

FOLHA DE SÃO PAULO. Aprovação ao trabalho de Moro na Lava-Jato despenca, e rejeição sobe.

Disponível em <https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/03/datafolha-aprovacao-ao-trabalho-de-moro-na-lavajato-despenca-e-rejeicao-sobe-shtml>. Acesso em: 22 de março de 2021.

REGO. W. L e PINZANI, A. Vozes do Bolsa Família : autonomia, dinheiro e cidadania. 2ª ed. São Paulo: Editora UNESP, 2014.

SINGER, A. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.

 

[1] É o caso da jornalista e digital influencer, Joice Hasselmann, com 1.078.666 votos, a segunda deputada federal mais votada no estado de São Paulo, atrás apenas de Eduardo Bolsonaro com 1.843.735 votos. Kim Kataguiri, Alexandre Frota, Carla Zambelli também se elegem deputados federais pelo estado mais rico do país. Janaína Paschoal consegue quase 10% dos votos válidos para a Assembleia Legislativa de São Paulo, sendo seguida pelo “youtuber” Arthur Do Val, ligado ao Movimento Brasil Livre (MBL), a essa altura ainda apoiador de Bolsonaro. No Rio de Janeiro, Flávio Bolsonaro, filho do presidente, embora não seja necessariamente um “outsider”, elege-se senador pelo Rio de Janeiro, superando nomes tradicionais como César Maia, do Democratas (DEM).

[2] É o caso da ex-presidente Dilma Rousseff, então líder das intenções de voto ao senado por Minas Gerais. Eduardo Suplicy, também líder de intenções de votos ao senado por São Paulo derrete. Em Santa Catarina, Décio Lima, candidato do PT a governador do estado, que chegou a liderar as primeiras pesquisas do período eleitoral, fica com apenas 12,78% dos votos válidos, em 4º lugar para governador. No Rio de Janeiro, Lindbergh Farias não consegue se eleger senador.

[3] Rio Grande do Norte, Piauí e os expressivos colégios eleitorais de Bahia e Ceará

[4] Alguns casos são até mesmo curiosos, em Pernambuco, por exemplo, tivemos os dois principais candidatos a governador do estado, Paulo Câmara, do Partido socialista brasileiro(PSB), e Armando Monteiro, do Partido trabalhista brasileiro (PTB), dizendo-se apoiadores da candidatura de Fernando Haddad e tentando “colar” seus nomes ao de Lula. O curioso desta situação é que Paulo Câmara, então governador, havia apoiado o processo de impeachment da então presidenta Dilma Rousseff, enquanto Armando Bezerra, ex-ministro de Rousseff, votou contra o impeachment. O PT apoiou Paulo Câmara oficialmente, contribuindo para que um então governador combalido, com taxas de rejeição preocupantes, vencesse as eleições em primeiro turno. No Piauí, Ciro Nogueira, então senador pelo Partido Progressista (PP) e favorável ao impeachment da ex-presidenta, aliou-se a Wellington Dias, do PT, para concorrer às eleições para o senado, obtendo êxito. Na Bahia, ACM Neto, prefeito de Salvador pelo DEM e representante da velha oligarquia baiana, não disputa as eleições para governador e nenhum outro cargo, preferindo resguardar-se. Na Paraíba, o então líder do PSDB no senado, Cássio Cunha Lima, representante de oligarquias paraibanas, não se reelege ao cargo, posicionando-se ao fim da “corrida eleitoral” em uma pífia 4ª posição entre os candidatos, com apenas 17,53% dos votos válidos.

[5]Além das reeleições de Ruy Costa, Camilo Santana e Wellington Dias, há também a vitória de Fátima Bezerra, tornando-se governadora no Rio Grande do Norte, após ter sido derrotada para as eleições de prefeita de Natal em 1996, 2000, 2004 e 2008. Jacques Wagner, do PT baiano, que chegou a ser apoiado por amplos setores do PT para lançamento de candidatura à presidência, reelege-se senador. Humberto Costa, do PT de Pernambuco, também se reelege, havendo ainda naquele estado a ascensão de Marília Arraes no cenário político, tornando-se a segunda deputada federal mais votada do estado. Dessa maneira o PT ganha ramificações na política institucional nordestina, “nordestinizando-se” e se expandido para além da figura de Lula. Considerando os votos para deputado federal, o PT consegue ser o partido com mais votos nos estados da Bahia, Piauí, Sergipe e Rio Grande do Norte. No que diz respeito aos deputados estaduais, o PT tem maioria nos mesmos estados, excetuando-se o Rio Grande do Norte. O PT se ramifica no Nordeste.

[6] O Partido Comunista do Brasil (PCdoB) reelege Flávio Dino como governador do Maranhão com quase 60% dos votos válidos. A vitória de Dino tem ainda maior significado, uma vez que derrotou Roseana Sarney, representante de uma das mais fortes oligarquias políticas do país, no 1º turno. Na Paraíba, Ricardo Coutinho, do PSB, filiado ao PT até 2013 e importante articulador do acordo entre PSB e PT nas eleições de 2018, consegue transferir sua popularidade, em forma de votos, para o então desconhecido secretário estadual de Infraestrutura João Azevedo. Em Alagoas reelege-se Renan Filho, filho de Renan Calheiros, líder político do Movimento democrático brasileiro (MDB) no senado, de ala mais próxima ao PT. Em Sergipe vence Belivaldo Chagas, com Eliane Aquino, do PT, como vice-governadora.

[7] No início da discussão sobre o auxílio, o governo havia sinalizado para o valor de R$ 200,00 mensais. Um grupo de deputados, principalmente de partidos de oposição tentava fazer com que o auxílio fosse de R$ 500,00. Vendo próximo a uma derrota, o governo sinalizou para o valor de R$ 600,00.

[8] Nesse sentido, vale destacar o trabalho de Rego e Pinzani (2014) no qual os autores, a partir da abordagem das “capabilities” de Amartya Sen, percebem, em várias áreas do Nordeste, transformações importantes na vida dos beneficiários do Bolsa-família, no sentido da construção de projetos individuais de autonomia e liberdade.